Menos barulho e menos violência

Dificilmente alguém terá alguma explicação para uma briga de vizinhos por barulho que acaba em três mortes. Mas há que se condenar a possibilidade de se manter arma de fogo, o que certamente teria evitado a tragédia que vimos recentemente.

Fábio Feldmann - Consultor em sustentabilidade

Por Fábio Feldman*

Dificilmente alguém terá alguma explicação para uma briga de vizinhos por barulho que acaba em três mortes. Mas há que se condenar a possibilidade de se manter arma de fogo, o que certamente teria evitado a tragédia que vimos recentemente.

Quero chamar atenção para que a sociedade brasileira seja mais cuidadosa em relação à questão do barulho, que tem provocado muitos conflitos em contextos diferentes. Pessoalmente, morador de uma pequena vila em Pinheiros, tenho sido vítima desse problema.

Isso me obrigou por diversas vezes a recorrer à Prefeitura para resolvê-los, demandando um esforço pessoal grande: britadeira de obra pública em um domingo, karaokê instalado em um bar próximo e até mesmo um gerador, cujo responsável não consegui identificar. No caso da britadeira, registrei boletim de ocorrência na delegacia competente e até hoje, decorrido muito tempo, nada aconteceu.

Conheço casos em que pessoas pacatas perdem totalmente a razão depois de submetidas a noites mal dormidas por meses a fio. Quem quer dormir ao lado de uma balada? Estudos científicos têm mostrado que pessoas absolutamente normais podem ser tomadas por um sentimento de impotência e raiva quando submetidas a barulhos em excesso, e que os impactos da poluição sonora na saúde e na perda de audição estão alcançando proporções epidêmicas nos Estados Unidos.

A agência americana EPA – Environmental Protection Agency – estimou recentemente que 13,8 milhões de americanos estão normalmente expostos a ruídos excessivos e que 30 milhões sofrem com ruídos ocupacionais. No caso da Europa, a European Environment Agency, estima que 65% dos cidadãos europeus, isto é, 450 milhões de pessoas são expostas regularmente a níveis de ruído acima do padrão. E a questão perdura há séculos: Julio César chegou a editar uma legislação que restringia a velocidade das carruagens para preservar o direito ao sono dos romanos.

Hoje em dia, há em curso um esforço grande de se rediscutir os padrões existentes em termos dos limites de ruído. E, mais do que isso, trata-se de uma questão complexa com repercussão em vários campos: melhor organização do poder público para fazer frente aos conflitos gerados pelos barulhos; planejamento urbano, incorporando essa questão e determinando especificamente padrões por zona; padrões cada vez mais rigorosos para determinados bens, tais como automóveis, caminhões, eletrodomésticos. Enfim, estamos falando de um repertório vasto.

Voltando à tragédia, é importante se assinalar que uma recentíssima norma da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas, que trata do desempenho das edificações habitacionais, tratou da matéria no capítulo sobre desempenho acústico. E se de fato for implementada, muitos conflitos entre vizinhos de edifícios poderão ser evitados.

A perturbação pelo uso de salto alto não ocorrerá, bem como barulhos de descargas de banheiros, latidos de cachorros e até mesmo ruídos provocados pela intimidade dos casais. Este último, objeto de muitos julgados de nossos tribunais.

Mas, acima de tudo, o respeito ao próximo sempre será a regra básica no tratamento de questões dessa natureza.

*Fábio Feldmann é consultor em sustentabilidade