Um projeto acústico de alta complexidade executado em uma edificação já existente na avenida Paulista adota tecnologias avançadas

Ao completar 40 anos, a CNN Cable News Network primeiro canal de televisão dedicado à cobertura jornalística 24 horas por dia, ao abrir sua sede no Brasil, em 2020, em plena avenida Paulista, em São Paulo, contou com um dos projetos de acústica mais desafiadores e de alta complexidade da Giner, empresa responsável pela elaboração do projeto e acompanhamento da obra na CNN São Paulo.

Com um moderno sistema de transmissão, locução e edição o projeto da CNN, inaugurado em 2020, abrange 3 estúdios de gravação, 22 salas técnicas incluindo Locuções, PPA’s, Ilhas de Edição e Switchers, além das salas administrativas, de redação, de reuniões e de diretoria. Mas as atrações principais do projeto e que apresentou os principais desafios foram os três estúdios de televisão.

Requisitos exigidos

“O principal estúdio de gravação além de possuir pé direito duplo com vigas intermediárias, deveria ser posicionado de modo a possuir vista direta para a avenida Paulista”, conta o engº José Carlos Giner, diretor técnico da Giner, ao lembrar do ambiente designado ao futuro Estúdio principal da CNN Brasil.

Um requisito do projeto, consistia no posicionamento dos estúdios próximos às fachadas de vidro da edificação, voltadas para a avenida Paulista. Logo, foi necessário um cuidado especial para o projeto das fachadas, levando em consideração que a paisagem sonora do local, além de elevado ruído de tráfego de veículos e helicópteros, é composta por manifestações, shows ao ar livre e eventos culturais aos finais de semana. Então, para atingir um alto desempenho de isolamento acústico foi necessário utilizar vidro triplo nas fachadas, visando garantir uma curva NC 35 nos estúdios.

Segundo a engª Bárbara Fengler, da Giner, “como todo o complexo da CNN foi construído em uma edificação já existente, as limitações físicas e construtivas do espaço foram responsáveis por aumentar ainda mais o nível do desafio. O fato de ser um retrofit proibia a utilização de soluções pesadas, devido à sobrecarga que teria na estrutura existente, bem como soluções de forro e piso muito espessas, por causa do pé direito limitado em grande parte dos ambientes”.

Outro desafio estava relacionado com as vibrações ocasionadas pela movimentação de pessoas na edificação e passagem de transporte público. As áreas destinadas aos estúdios estavam localizadas exatamente acima da linha de metrô da avenida Paulista, configurando uma importante fonte de vibração devido a passagem de trens.  Além disso, durante a inspeção do local, foram detectados níveis de vibrações consideráveis referentes ao tráfego de usuários na própria edificação em horários de grande fluxo como, por exemplo, no de almoço.

Logo, foi necessário realizar estudos específicos de controle de vibrações, uma vez que estas poderiam, entre outros problemas, interferir nas câmeras de gravação. Para controle das vibrações foi realizado estudo de especificação e distribuição de pad’s acústicos, pendurais antivibratórios específicos para os estúdios e desacoplamento de paredes da estrutura existente.

“O projeto acústico foi desafiador ao pensar na compatibilização das disciplinas envolvidas, desenvolvimento do layout das salas técnicas, definição das passagens dos cabos, dutos de ar-condicionado, cenografia etc. A observação de todos estes detalhes foi fundamental para que o projeto acústico atendesse aos requisitos solicitados pela CNN”, aponta a coordenadora do projeto, engª Raquel Rossatto Rocha, da Giner.

Para o projeto de condicionamento acústico dos estúdios (que tinham como objetivo um tempo de reverberação de 0,5 segundos), se fez necessário “esconder” os materiais de absorção e dispositivos aplicados de modo a não comprometer o cenário dos locais.

Na fase de acompanhamento de obras, contou-se com a utilização de uma câmera acústica hand-held. A câmera acústica é um dispositivo de ponta para medições que utiliza a técnica de beamforming. Com ela, foi possível obter a visualização de vazamentos de som entre ambientes e identificar os pontos de maior vulnerabilidade de portas, esquadrias e sistemas de ar-condicionado. 

“Esta tecnologia, apresenta um diagnóstico em tempo real de defeitos construtivos durante a execução da obra, possibilitando ações rápidas e eficientes, atuando exatamente no foco do problema”, comenta José Carlos Giner.

“O projeto acústico da CNN foi um grande desafio e garantir a execução do projeto com todo o cuidado necessário foi a segunda etapa desse desafio. Além de um projeto detalhado e compatibilizado, o acompanhamento à obra também foi fundamental para resolução de interferências pontuais”, comenta Raquel Rossatto Rocha.

E foi logo na inauguração da CNN Brasil que os sistemas de isolamento acústico dos Estúdios da CNN foram postos à prova. Nesta data, ocorreu grande manifestação na avenida Paulista, apresentando ruído elevado externamente ao prédio. A acústica dos estúdios, como esperado, não foi afetada, garantindo a execução dos trabalhos da emissora.

Soluções acústicas

Estúdio principal

Com um espaço medindo, aproximadamente, 175 m² e pé direito duplo, o estúdio principal é o maior da edificação. Para realizar o isolamento acústico do Estúdio principal, utilizou-se a técnica box-in-box. Para isso, foi utilizado piso flutuante com pads, garantindo o sistema box-in-box e, além disso, mantendo a estabilidade do piso para evitar a trepidação da câmera de gravação.

Devido a cobertura esbelta, fato que deixava o estúdio desprotegido dos ruídos externos, foi instalado o forro flutuante com pendurais antivibráticos específicos para as elevadas cargas suspensas nesse forro. Os pendurais foram projetados para a carga em questão.

  Imagem da distribuição dos pendurais no estúdio principal
Pendurais do Estúdio principal
Estúdio principal mostra o vidro duplo entre corredor e o estúdio principal, além das infraestruturas do estúdio | vista do 2º pavimento

Para o condicionamento do estúdio principal havia várias interferências: no primeiro pavimento, não poderia ter nenhum material de revestimento acústico, pois todas as superfícies eram destinadas ao cenário; no pavimento superior (devido ao pé direito duplo) havia toda a infraestrutura do cenário como holofotes, caminhos das câmeras de gravações e dutos de ar-condicionado.

Para tanto, a solução foi aplicar baffles acústicos, para possuir maior área de absorção, distribuídos no estúdio sem interferir nas demais infraestruturas. Foram distribuídos 251 baffles na cor preta. Nas paredes do pavimento superior, onde havia área disponível, foram inseridos painéis absorventes com espessura 150 mm e densidade 30 kg/m³. Toda distribuição e quantidade de material foi simulado no software EASE.

Croqui das posições dos baffles
Modelo do Estúdio principal no software
EASE com os baffles
Média TR = 0,73 s em 1000 Hz / resultado simulado
Gráfico do TR no Estúdio 1 obtido pelos ensaios in loco

Após a construção do estúdio, foram realizados os ensaios in loco do tempo de reverberação. Medição tempo de reverberação no Estúdio Principal: TR = 0,62 s em 1000 Hz.

A fachada do estúdio principal foi o grande desafio. Como a fachada de vidro existente não possuía boas vedações foi considerado o vidro existente da fachada, de 10 mm + espaço de ar 890 mm + vidro monolítico novo de 10 mm + espaço de ar 590 mm + vidro triplo blindado de 28 mm. Os espaços de ar foram propositais para o alinhamento com os pilares e, o principal, contribuíram no desempenho acústico da fachada. Considerando todo o sistema de vidro da fachada, obteve-se no software INSUL o Rw = 68 dB. Os vidros foram inclinados para evitar a criação de “fantasmas” durante as gravações e, para acústica, contribui para não ter superfícies reflexivas paralelas, evitando o efeito flutter eco.

Modelo da simulação no SONArchitect
Simulação dos vidros dos estúdios no software INSUL

Resultados simulados
Rw = 68 dB
D2m,nTw = 71 dB
NC 22
Rw = 58 dB
DnTw = 68 dB

Outro elo fraco no Estúdio principal foi a divisória entre ele e a redação. Foi especificado um vidro duplo para essa divisória, sendo caixilhos independentes. Um dos locais que se utilizou a câmera acústica foi nessa divisória, para analisar possíveis vazamentos sonoros.

Estúdio principal com a câmera acústica e no fundo a redação
Estúdio principal
SimulaçãoMedição
NC 22NC 34
TR = 0,73 s em 1000 HzTR = 0,62 s em 1000 Hz

Comparações resultados simulados x ensaios in loco

Apesar de atender ao NC menor ou igual a 35 que era a premissa técnica, foi notável durante os ensaios que o ruído oriundo do ar-condicionado interferiu consideravelmente no NC do estúdio principal. Item alertado e ajustado após os ensaios.

Estúdios 2 e 3

Esses dois estúdios possuíam pé direito baixo, fato que prejudicava a compatibilização das soluções acústica X ar-condicionado X cenário. Após vários ajustes foi possível compatibilizar. Em função disso, optou-se pelo forro absorvente composto por lã de vidro 50 mm de espessura e densidade 30kg/m³ com face preta para não interferir na cenografia. Além do forro absorvente, havia o forro flutuante com antivibrático composto por chapas de gesso e lã mineral.

No piso, foi especificado o piso flutuante com pads calculados conforme a carga prevista dos equipamentos de gravação, cenários etc.

A fachada do Estúdio 3 foi prejudicada para o isolamento acústico, pois está localizada no canto da planta arquitetônica, ficando sujeita à indecência sonora direta da av. Paulista e na rua perpendicular. Após a sua construção, foi avaliado o NC desse estúdio e os resultados foram satisfatórios, obtendo-se NC abaixo de 35.

Resultados das simulações no Estúdio 3

Rw = 66 dB
D2m,nTw = 66 dB
NC 30

Estúdio 3 no 2º pavimento

SimulaçãoMedição
NC 30NC 23
Estúdio 2 mostra os painéis absorventes no teto
Estúdio 3 mostra os vidros da fachada
Estúdio 3 mostra os painéis absorventes no teto e as inúmeras interferências

Sala de redação

Como é um espaço aberto com grande concentração de pessoas conversando ao mesmo tempo, na redação foi instalado o forro absorvente composto por lã de vidro 50 mm de espessura e densidade 30kg/m³ com face preta para não interferir na cenografia do Estúdio principal, pois a redação aparece durante as gravações.

Na foto da redação (abaixo) dá para notar que não é possível identificar os revestimentos acústicos – umas das premissas do cliente.

Na fachada a especificação foi o vidro blindado de 28 mm, além do existente na edificação.

Redação: painéis absorventes no teto e no canto esquerdo a divisória de vidro com o estúdio principal
Corredor entre as ilhas de edição: painéis absorventes nas paredes, as divisórias de vidro acústicas e os atenuadores de ruído do ar-condicionado entre o corredor e as salas.

Ilhas de edição, locução, tradução e rádio

As demais salas técnicas foram projetadas e construídas utilizando o sistema box-in-box em composições diferenciadas.

É possível observar, na imagem abaixo, o piso flutuante nessas salas técnicas com os pads. Para isolar as salas técnicas geminadas foram instaladas divisórias em drywall, com preenchimento de lã mineral em ambos os lados, utilizando banda acústica em todo o seu perímetro. Cada sala possui o seu forro flutuante com pendurais antivibrático.

O ar-condicionado foi distribuído entre as salas, sem o duto atravessá-las, para não haver o efeito cross talk. Entre o corredor e a sala foram indicados atenuadores de ruído, dado que não seria possível uma máquina exclusiva para cada sala.

As portas acústicas indicadas foram de Rw 35 dB. Para o condicionamento acústico foram indicados painéis absorventes nas paredes laterais aos operadores e acima do operador e carpete no piso.

Obra das ilhas de edições
Ilha de edição: carpete e os painéis absorventes laterais
Rádio: painéis absorventes no teto

Outras informações
Execução da obra Informov IT’S Engenharia. Área total: 3.410 m². Tempo de obra: 3 meses

Crédito fotos: IT’S Engenharia
Fotos: Marcelo Donatell