Plantas panorâmicas em ambientes corporativos são solução para uma arquitetura saudável no pós-pandemia

Há pouco mais de dois anos boa parte dos engenheiros, arquitetos e profissionais de acústica, especializados em projetos corporativos observavam sobre a tendência de desaparecimento dos escritórios de planta livre – open plan (escritórios coletivos e panorâmicos). A ideia era acabar com os impactos da reverberação sonora desses locais de trabalho na saúde e no desempenho profissional dos colaboradores. Acontece que o imponderável trouxe logo em seguida uma das mais graves pandemias que a humanidade já havia presenciado, a da Covid-19. E a crise sanitária se impôs sobre qualquer outra questão de saúde ou necessidade de melhoria de conforto e condições físicas nos ambientes de trabalho.

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A nova realidade tornou indispensável a necessidade de se evitar a formação de aglomerações ou reuniões a portas fechadas e em salas sem troca de ar constante. Por outro lado, é senso comum que ambientes abertos geram desconforto, dificuldade de concentração e falta de privacidade. Estudos realizados, em 2019, pelo Instituto Nacional de Pesquisa da Saúde e Segurança do Trabalho, na França, mostram que trabalhar o dia todo exposto a conversas paralelas e inteligíveis gera cansaço, estresse e efeitos nefastos nos sistemas nervoso, cardiovascular e digestivo.

A proteção da saúde dos trabalhadores, segundo Rafael Schmitt, diretor da Scala dB, exige controle sobre a inteligibilidade da fala que normalmente é prejudicada por conversações de ligações telefônicas, vídeo chamadas e entre os próprios colaboradores. Este aspecto envolve fatores como tempo de reverberação, som residual, relação sinal-ruído, mascaramento sonoro, entre outras circunstâncias. “Projetar ambientes adequados é essencial para o bom andamento das atividades desempenhadas nos diferentes espaços”, ressalta.

Com a possibilidade do fim da pandemia a questão obriga manter a qualidade acústica, que também é um fator de saúde, em um cenário que ainda exige necessidade de distanciamento e prioridade para circulação de ar. Um desafio enorme para gestores de recursos humanos e projetistas da chamada arquitetura saudável.

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As adaptações da rotina de trabalho estão ocorrendo de forma constante. Agenda de turnos híbrida, onde colaboradores intercalam dias de trabalho em casa e no escritório, e mudanças nos fluxos de movimentação de pessoas para evitar aglomerações já são uma prática. Inclusive a mudança de ambiente constante e diminuição na utilização de meios de transporte todos os dias parece ter caído no gosto da maioria dos trabalhadores.

De acordo com a engenheira Bárbara Fengler, do escritório Giner, “os espaços tipos open plan tendem a permanecer nos ambientes corporativos, pois permitem diversas configurações de trabalho e são, na maioria dos casos, espaços grandes e com bastante ventilação. Neles é possível abrigar vários trabalhadores com adequada distância entre eles e, ainda, favorecer a rotina híbrida cada vez mais comum, já que não existe mais a ideia de postos fixos de trabalho”, explica.

Salas pequenas para mais de uma pessoa, de fato, já são quase inexistentes nos projetos corporativos atuais. Entretanto, a utilização das cabines chamadas “phone booth” está em alta. “Como o espaço é planejado para uma pessoa só, esse local que antes vinha sendo adotado para realização de atividades individuais − que exigiam foco e concentração − mudou de finalidade. Agora está sendo utilizado para a realização de conferências por vídeo. Algo que se tornou comum na pandemia. Projetos de ambientes específicos para realização desse tipo de atividade tendem a crescer”, ressalta ela.

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Outro aspecto importante que vem acontecendo na atualidade, explica Schmitt, “é que em escritórios onde a qualidade acústica foi projetada e implantada, os colaboradores estão preferindo o trabalho de forma presencial pela questão do conforto do ambiente de trabalho, tanto no aspecto acústico quanto ergonômico. No home office, na maioria das vezes, ocorre falta de privacidade acústica (barulhos externos, entre vizinhos) e tem maior exposição aos riscos ergonômicos”, afirma.

Segundo Marcos Holtz, vice-presidente de atividades técnicas da ProAcústica, e sócio-diretor da Harmonia, “nos projetos mais recentes os arquitetos ainda têm utilizado ostensivamente os escritórios de planta aberta. O que mudou foi a quantidade de pessoas por metro quadrado, que tem diminuído, permitindo um distanciamento maior dentro dos escritórios”, pontua. 

Se nenhum outro fato de impacto global acontecer, a tendência é de que o mercado adapte de forma temporária os espaços abertos e busquem no futuro mudanças para configurações mistas, intercalando grandes salas e espaços menores. Juan Frías, da Bracústica, também concorda que “no cenário pós-pandemia as empresas continuam apostando nas plantas abertas. Nos casos onde o espaço não é problema, as empresas aproveitam o máximo a maior distância entre colaboradores”, explica.

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As principais soluções acústicas para salas abertas, segundo Schmitt são os anteparos acústicos para controle da propagação do som, por meio de mobiliários especiais (com altura apropriada), biombos e materiais com propriedades de absorção sonora como forros absorvedores, nuvens acústicas e baffles. Em locais fechados, são mais usuais as divisórias acústicas em vidro, paredes drywall, portas acústicas, visores, forros fonoisolantes e fonoabsorventes, revestimentos absorvedores, entre outros.

Nesses espaços o ruído de fundo de equipamentos e do exterior precisam ser controlados, onde os tetos revestidos com materiais de alta absorção sonora precisam ser pré-requisitos. Nas salas onde não se deseja utilizar forros, os baffles e nuvens ajudam a obter absorção sonora. Salas de treinamento, reunião e estúdios precisam ser condicionados para gravação e reprodução sonora por meio de materiais fonoabsorventes e difusores, com um envoltório isolado que permita o uso simultâneo sem distrações.

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De acordo com Holtz, as cabines que se multiplicaram nos escritórios devem ser muito bem projetadas, pois qualquer fresta pode ser um grande problema à privacidade. Estas cabines devem ter sistemas de renovação de ar tratados acusticamente e portas acústicas mais pesadas e com vedações especiais.

Segurança sanitária

A questão sanitária ainda causa grande preocupação e a utilização de materiais de fácil limpeza e manutenção é de suma importância no cenário pós-pandêmico. A porosidade, por outro lado, é uma característica que contribui para absorção sonora. Assim é imprescindível alinhar eficiência acústica com a facilidade de limpeza e para isso existem materiais disponíveis no mercado que garantem essas premissas.

No contexto da segurança sanitária, a ventilação natural e o desempenho acústico são temas complexos nas estruturas corporativas. Frías conta que o seu escritório se deparou com alguns projetos onde foi super dimensionado o sistema de ventilação natural para se obter maior renovação do ar em relação ao que se acostumava a fazer antes da pandemia.

Fengler relata que a ventilação é a premissa inicial de diversos projetos. “Para que ventilação prejudique o menos possível a qualidade acústica é importante o estudo do layout dos espaços, colocando, por exemplo, ambientes mais sensíveis, como salas de reunião, afastados das fachadas mais ruidosas. Em contrapartida, a utilização de sistemas de ar-condicionado com renovação do ar também têm se tornado cada vez mais comum”, explica a engenheira.

Barreiras de materiais transparentes, como o acrílico, têm sido utilizadas para separar mesas, áreas, setores e evitar o intercâmbio do ar compartilhado entre as pessoas. O uso de máscaras ainda tem sido praticado na maioria dos locais.

Outro ponto importante é a compatibilização entre os projetos de acústica e ar-condicionado para impedir que os dutos se tornem pontes acústicas entre os ambientes a fim de evitar o incômodo causado pelo ruído de máquinas de refrigeração. Nesse aspecto, no campo de amortecimento de vibração, segundo Edvaldo Ribeiro, da empresa Vibranihil, houve aumento de consultas para redução de ruídos causados por vibrações de bombas, transformadores, elevadores e condensadoras de ar-condicionado. “Que na maioria dos casos foi mitigado com a instalação da Base de Inércia (anti-vibratória) e amortecedores”.

Dessa maneira, os escritórios de plantas abertas – que estavam entrando em desuso por causa do ruído de fundo e por causar perda de atenção – se tornaram uma opção nesse momento onde se busca espaçamento entre as pessoas. A relação que a maioria das pessoas tem com o local de trabalho nunca esteve tão insegura como no momento atual. A figura do executivo que mantinha uma relação de décadas com o endereço do escritório foi transformada. A referência que a maioria das pessoas tinha sobre o que era local de trabalho, como espaço físico, nunca mais será a mesma.

Créditos Imagens: Giner