Ruídos dos sistemas hidrossanitários precisam de atenção no debate da acústica predial

No cenário atual onde as construções têm alcançado níveis de industrialização – com obras sendo executadas sob maior controle de qualidade – as possibilidades de geração de ruído e incômodos provenientes dos sistemas hidrossanitários nas edificações se tornaram tema delicado. E, ainda, de extrema importância para projetistas, escritórios de consultoria e engenharia acústica, fabricantes de tubos, conexões e de soluções de isolamento e absorção sonora na busca por desempenho acústico e atendimento aos requisitos da norma ABNT NBR 15575.

“Muitas das causas de ruído hidrodinâmico têm a ver com a ausência de boas práticas na fase de projeto. Por isso, é fundamental a interação entre o consultor de acústica e o projetista de instalações. Um assunto que reside na coordenação, compatibilização e interação entre disciplinas, que responde por grande parte dos problemas e que acaba sendo muito pouco comentado”, ressalta José Augusto Nepomuceno, coordenador do Comitê Acústica de Salas da ProAcústica.

Por esses motivos a fase de concepção de projetos na construção civil torna-se o paradigma apontado pela grande maioria dos especialistas. É o momento onde as fontes de ruído oriundas dos sistemas hidrossanitários precisam ser mapeadas por projetistas e debatidas com especialistas em acústica no momento dos estudos de viabilidade da obra.

Os principais pontos críticos na transmissão das vibrações e ruído entre os elementos construtivos começam a partir dos tubos verticais, cotovelos, caixas sifonadas, válvulas de descarga e velocidade excessiva de escoamento da água. O escoamento de fluidos nas tubulações gera atritos e vibrações, influenciados pela velocidade e vazão, mudança de direção (curvas, derivações etc.), entre outros aspectos.

Fotos: Aubicon

O choque da água com as superfícies dos equipamentos de utilização como cubas, lavatórios, banheiros e pias; escoamento de água pela bacia sanitária, ralos e sifões, tubulação de esgotos; e deslocamento de bolsões de ar pelas tubulações também são fatores relevantes no contexto sonoro dos sistemas.

O “golpe de aríete” ou “martelo d’água”, causado por variações na velocidade da água ou pressão nas tubulações, é outro evento importante. Para evitar esse fenômeno é necessário promover a redução da velocidade do fluido aumentando o diâmetro do tubo e o tempo de fechamento das válvulas de descarga. Fazer a instalação de câmaras de ar comprimido que proporcionam o amortecimento do golpe e chaminés de equilíbrio também são ações que contribuem para eliminar o problema.

“Algumas decisões em fase de projeto, após análise de viabilidade técnico-econômica como, por exemplo, planejar saídas horizontais de esgoto sanitário fazendo com que as tubulações não estejam diretamente no banheiro da unidade abaixo; evitar prumadas nas paredes de dormitórios; projetar curvaturas com fator duas vezes o diâmetro nominal da tubulação, para evitar curvas acentuadas (ex: 90º); entre outros cuidados, são fundamentais para o desempenho acústico do projeto”, ressalta Rafael Schmitt, da consultoria Scala Acústica.

Os requisitos da norma de desempenho ABNT NBR 15575 para o tratamento de ruídos hidrossanitários, segundoRaquel Rossato, coordenadora técnica da consultoria Giner, exigem que os sistemas não produzam níveis de pressão sonora elevados no interior dos dormitórios. “Existem requisitos para o nível de pressão sonora equivalente padronizado (LAeq,nT) e para nível de pressão sonora máximo padronizado (LASmax,nT). Os dois devem simultaneamente atender a um dos níveis de desempenho, mínimo, intermediário ou superior. As exigências básicas são apenas informativas, ou seja, não são obrigatórias”, ressalta Rossato.

De acordo com a engenheira acústica, Marcela Monteiro, especificadora de mantas acústicas na Aubicon, as avaliações de ruído hidrossanitário são realizadas pelo método da ISO 16032 e consistem em ciclos que reproduzem o funcionamento cotidiano como, por exemplo, o tempo compreendido desde que é pressionada a descarga até a finalização do enchimento da caixa acoplada. São coletadas diversas amostras de níveis de pressão sonora em pontos distintos, de acordo com o procedimento de ensaio, com o objetivo de encontrar os resultados de níveis equivalentes e máximo padronizado”.

Além disso, métodos são descritos na ISO 10052 – Acústica – Medições de campo de isolamento de ruído aéreo e de impacto e de som de equipamentos de serviço, pelo qual obtêm-se uma estimativa dos níveis de pressão sonora do equipamento predial pelo método simplificado.

As práticas de projeto e execução capazes de minimizar esses problemas se dividem em três principais formas de atuação: envelopamento das tubulações, desconexões entre tubos e estrutura e aplicação de forros com boa capacidade de isolamento sonoro e estanqueidade acústica. Entre as soluções mais utilizadas para atenuar o incômodo estão a instalação de câmaras de ar para amortecer as excitações do fluido na tubulação; difusores para evitar o surgimento de bolhas causadas pela alteração de pressão; articulações flexíveis entre a bomba e a tubulação; redução da cavitação, com mecanismo que suaviza os estrangulamentos e redutores de pressão; e isolantes ou molas para amenizar as conexões rígidas entre a tubulação e a estrutura da edificação.

Fotos: Aubicon

“Infelizmente é recorrente acontecer alguns problemas de compatibilização entre as disciplinas, como: pequena dimensão do shaft, que impossibilita executar o envelopamento das tubulações; tubulações de esgoto de banheiros do pavimento superior presentes no entreforro do dormitório do pavimento inferior; compartilhamento de shafts entre unidades distintas; entre outras situações incorretas para a solução acústica”, detalha Rossato.

Com relação à aplicação de mantas acústicas de fibras de lã de rocha ou de borracha no envelopamento da tubulação, Monteiro explica que “as de borracha possuem alta densidade e proporcionam melhor desempenho acústico quando comparadas às de rocha”. Já no caso das instalações de bombas, a especialista alerta que, para atenuação dos ruídos e vibrações, é importante prever a localização de plataformas de assentamento com bases de inércia e amortecedores com juntas flexíveis.

De modo geral, no contexto dos ruídos dos sistemas hidrossanitários, a compatibilização entre as disciplinas é primordial para evitar que na evolução do projeto as boas práticas acústicas sejam inviabilizadas. Nesse sentido, é fundamental que os profissionais envolvidos na obra busquem soluções para fluir o entrosamento entre as instalações prediais, a acústica e a arquitetura.